Entrevistas

Antonio Araújo: nas seis cordas do Korzus e com mil projetos na cabeça

Por Vagner Mastropaulo | Em 03/11/2020 - 00:18
Fonte: Alquimia Rock Club

Fotos: Du Firmo

 

Agradecimentos a: Isabele Miranda (assessora de imprensa)

 

Projetos podem nascer das mais variadas formas: necessidade, vontade, curiosidade, seriedade, obrigação, brincadeira... Ops, Brincadeira? Sim! Ao receber o convite para entrevistar os cinco integrantes do Korzus, feito por sua assessora de imprensa, a proposta original era bem simples: “Umas vinte e cinco perguntas, cinco para cada um”. Mas como complicar a vida é meta para este escriba, a contra-proposta foi ambiciosa: “Vinte e cinco no total? Para cinco caras? Por que não fazer vinte e cinco a cada um deles então?”, meio que de brincadeira (olha a palavra aí de novo!). Só que Isabele Miranda comprou a ideia: “Inovador! Vamos ver no que isso dá”. Pois é até comum você ver todos os membros de um grupo numa coletiva, mas um ou dois sempre acabam dominando – os mais antigos, em geral. Encerrada esta primeira parte e conforme dito: ainda temos que ver no que tudo isso vai dar. Por ora, fiquemos com o bate-papo com o guitarrista Antonio Araújo, focando no Korzus (como não?) e em seus projetos paralelos. Apenas não nos responsabilizamos se ele já tiver criado mais algum no meio tempo entre a entrevista e sua publicação... Boa leitura!

 

Vagner Mastropaulo: Melhor começarmos pelo princípio mesmo: para quem ainda não sabe, como você foi parar no Korzus? Como os caras te contataram?

 

Antonio Araújo: Eu já tinha uma amizade com Heros, pois ele havia produzido o disco da minha antiga banda, o ChaoSphere, de Recife. Passamos muito tempo juntos nessa produção e nunca perdemos contato. Através dele, conheci os outros e nos demos muito bem. Com a saída definitiva do Silvão, rolou a oportunidade de fazer o teste e aqui estamos!

 

VM: O Korzus fez sua primeira live no Manifesto em 20/06 e, “por questões logísticas” você não pôde participar. Na prática, por morar em Recife, não faria sentido te expor a riscos desnecessários viajando a São Paulo em meio a uma pandemia, mas dá para imaginar você assistindo a tudo. Marcio Garcia, o Marcinho, técnico de guitarra, segurou a onda e fez suas partes, na segunda parte do show. 

 

AA: Foi consenso de que ainda estava muito cedo para que eu arriscasse aeroportos e aviões naquele momento e seria um risco para todos. Preferimos fazer um show misto com o Silvão tocando o Ties Of Blood na íntegra e meu querido parceiro Marcinho tocando o restante do repertório.

 

VM: Aliás, o Pompeu chegou a dedicar a segunda parte do show a você, a partir de “Discipline Of Hate”. Ao ouvir isso, deve ter batido aquela sensação de: “Cacete, queria estar lá com os caras!” e deve ter sido estranho você ver a sua banda de casa.  De partir o coração, não? Como foi isso?

 

AA: Foi foda... fiquei num misto de alegria por ver meus amigos finalmente tocando, mas com aquela sensação inevitável de querer muito estar lá, tocando e curtindo junto. Mas fiquei muito feliz de ter sido lembrado e me senti presente ali naquele palco, de alguma forma.

 

VM: Efetivado, você passou a morar em São Paulo e por aqui ficou de 2008 a 2014. O que te fez voltar a Recife, a três horas de avião para cá?

 

AA: Eu e minha esposa somos recifenses. E depois que “engravidamos”, não fazia mais sentido ficar morando longe das duas famílias. Avós, tios, primos e primas... queríamos essa convivência para nossa filha.

 

 

 

 

VM: Você é o membro mais “novo”. Das músicas anteriores à sua chegada, qual é a que mais te satisfaz em tocar (seja pela cadência, letra, riffs, reação da galera ou qualquer outro motivo)?

 

AA: Tem muita música legal de tocar no Korzus. Para escolher uma que acho foda e sempre me divirto tocando, eu diria “The World Is A Stage”.

 

VM: Bandas com dois guitarristas requerem uma dinâmica de parceria entre ambos. Não que ela não exista com os outros músicos, mas você e Heros “dividem” o mesmo instrumento. Como funciona a química com ele no tocante à composição? Vocês bolam riffs juntos? Ou preferem ter idéias separadamente e mostrar o material um para o outro apenas quando o esboço está finalizado? 

 

AA: Eu e Heros nos entendemos super bem musicalmente. A comunicação é fácil e natural. Quando criamos juntos, muitas idéias boas fluem com facilidade. Ele é um grande músico e um super produtor.

 

VM: Vi sua participação num episódio do Buteco De Quinta em junho e, num dado momento, você expressa profunda admiração pelo grande Inaldo “Spok” Cavalcante. Xeretando pelo YouTube, encontrei uma participação especial dele tocando frevo com seu baterista, Adelson da Silva, em espetáculo da Jazz Sinfônica Brasil, gravado no Theatro Municipal de São Paulo e postado no canal oficial da TV Cultura em 21/05/18. Aproveitando a oportunidade, diga tudo achar relevante sobre o trabalho do Maestro Spok com o frevo, em especial algo sobre a SpokFrevo Orquestra.

 

AA: Para mim, Spok é um gênio. O cara é responsável por uma modernização necessária do frevo, aqui em Recife, e sua conseqüente exportação para todo o mundo. Um cara cheio de garra para montar um time de músicos verdadeiramente excepcionais! E um dos homens responsáveis pela manutenção da importância deste estilo, que é um dos poucos restantes de música brasileira de qualidade que segue em voga e sendo apreciado pelas massas.

 

VM: Gostaria que você dissesse o que sentir que deve sobre suas ex-bandas e projetos paralelos: o que cada um deles tem preparado para o futuro, embora todos saibam que sua prioridade é o Korzus. Comecemos pelo ChaoSphere, que, como você mesmo adverte em entrevista ao canal de YouTube United By Metal em 19/04, não pode ser confundido com o Chaosfear, banda de thrash de São Paulo. Aliás, tinha um Chaosphere também na Polônia, de death/thrash e, no mesmo ano que vocês lançaram Hell Is Here, eles vieram com Reign In Chaos. E tem outro na Itália, de gothic/death e mais difícil de pesquisar, que lançou Hypnophobia, um ano antes. Pior, o site Metal Archives lista outras seis bandas xarás, porém menores. Você tinha conhecimento desses grupos?

 

AA: Tive conhecimento de dois deles. O “Chaos” foi uma banda muito legal que me ensinou muito. Foram oito anos de muito amor pela música e pelo metal. Éramos ambiciosos, queríamos criar algo único e legal. E conseguimos pelo menos o legado de ter feito um disco do qual me orgulho bastante e de ter sido uma banda relevante para a cena de Recife naquela época. Tínhamos um público legal por aqui. Bons tempos.

 

VM: Coincidências à parte, já havia uns riffs sensacionais em Hell Is Here (2007). Que memórias você traz da experiência no ChaoSphere, ainda no Recife? E o que você aprendeu e carrega até hoje?

 

AA: Na verdade, no ChaoSphere havia poucos riffs meus. A maioria das composições era do baixista original, André Lyra. Mas é claro que havia contribuições em vários momentos e aprendi demais. O ChaoSphere foi a escola de rock que tive. No sentido de vivenciar na prática o que é ter uma banda: compor, arranjar, lidar com pessoas difíceis, subir num palco. Tudo isso é aprendizado para a vida toda.

 

 

 

VM: No ChaoSphere, você se dividia entre cantar e fazer a guitarra solo. É um processo natural para você ou requer mais concentração do que somente focar no instrumento, como no Korzus?

 

AA: Como qualquer coisa na música, requer prática. Na época eu era muito bom nisso, pois fazia sempre. Hoje em dia, se eu fosse fazer o mesmo, certamente não teria a mesma desenvoltura. Mas, com o tempo, certamente voltaria.

 

VM: E como você assumiu os vocais? Foi um plano para dar vazão artística diferente?

 

AA: Na real, comecei a cantar porque a gente não conseguia encontrar outro vocalista, depois de algumas tentativas frustradas. Aí assumi o posto e fui aprendendo, na porrada [risos].

 

VM: Não que seja um problema, mas, na média, são faixas com cinco a seis minutos de duração, embora “The Empire Of Lost Souls” chegue a 9’13” e “Sunrise, Sunset” tenha 2’46”. Como funcionava na hora de criar as composições? Você já disse que a maioria delas eram do André Lyra, baixista original, mas ele chegava com quase tudo pronto ou era um processo em equipe?

 

AA: O André era o maior responsável pelas composições. Ele realmente dominava essa parte aí e não dava muito espaço para que outros colaborassem. E ele chegava com quase tudo pronto. Havia, claro, input meu em vários momentos. Mas era 90% dele.

 

 

 

 

VM: Já com relação ao One Arm Away, corrija-me se eu estiver errado: trata-se de um projeto em que você, além de guitarrista, também é vocalista. Rodrigo Fantoni na guitarra (da equipe técnica do Machine Head e do Korzus), Felipe Andreoli no baixo (Angra) e Edu Garcia na bateria (John Wayne) completam o line-up e vocês já tem um play no catálogo, Carpe Ludus (2016). Já que é você quem canta, as letras também são criações suas?

 

AA: Sim, isso mesmo! Apenas o Fantoni não faz mais parte da banda, pois tinha muitos compromissos de agenda lá fora com seu trampo de equipe. De Carpe Ludus, o primeiro disco, e do single Oblivion Of Divinity, fui responsável por 100% das composições e letras.

 

VM: Como vocês chegaram a “One Arm Away” para batizar o projeto? Qual a estória por trás do nome?

 

AA: O nome remete à proximidade da morte. É inspirado em “Erva do Diabo”, conto de Carlos Castaneda, numa cena em que o shaman Don Juan ensina ao homem da cidade que as nossas mortes sempre nos acompanham, lado a lado... a um braço de distância. Por isso, “One Arm Away”.

 

VM: Que interessante! E mantendo o mesmo raciocínio para “Carpe Ludus”, o que significa o conceito e de onde ele surgiu?

 

AA: É uma modificação do famoso termo “carpe diem”, que significa “aproveite o dia” ou quer passar a mensagem de que você deve usar seu dia da melhor forma possível, pois toda vida é efêmera. Mas, no caso, “ludus” se refere a “ludare”, do latim “ilusão” ou “brincadeira”, numa alusão ao mundo ilusório em que a humanidade existe.

 

 

 

 

VM: Trocando de projeto, o site Metal Archives cita uma banda chamada Lockdown no seu perfil. Além de afirmarem que ela foi fundada neste ano, o próprio nome sugere algo recente, mas lá não há nenhuma outra informação sobre a empreitada. Pesquisando, me deparei com uma nota no Whiplash informando que o line-up ainda terá João Gordo no vocal (Ratos de Porão), Alex Camargo no baixo (Krisiun) e Bruno Santin na bateria (Endrah) e proposta Death metal. De cara, como você chegou a esses músicos para formar algo que parece um super-grupo?

 

AA: O Lockdown é comigo, o Gordo, Bruno Santin e Rafael Yamada (ex-Project 46 e atualmente Claustrofobia). Foi uma idéia minha de gravar um projeto death metal, que é um estilo que adoro, e dar vazão à vontade que eu e o Gordo sempre tivemos de fazer algo juntos. Parece que está assumindo proporções bem maiores no momento. Vamos lançar um EP com cinco músicas em breve.

 

VM: O que mais você pode nos contar a respeito? Vocês foram ligeiros em pegar o nome, pois, em virtude de tudo que o mundo está enfrentando, muita gente terá essa ideia.

 

AA: Death Metal, brutal, anti-religião. Tudo aquilo que o headbanger curte e sempre curtiu. Estou bastante feliz com o material, que está soando monstruoso. Aliás, ele está sendo mixado Dharma Studios, pelo meu amigo Rodrigo Oliveira.

 

VM: Por fim, ao menos quanto aos projetos, o Matanza Ritual traz você, Jimmy London no vocal (Jimmy And The Rats e ex-Matanza), Felipe Andreoli no baixo (Angra) e Amilcar Christófaro na bateria (Torture Squad e Kisser Clan). Em conversa com o Papo De Rock #5, de Fabiano Fusaro, da Rádio Líder FM 103,5, de Ubá (MG), Jimmy deixa no ar: “Quem sabe daqui a pouco a gente já está compondo alguma coisa”. O link é de 28/05, então conclui-se que não houve tempo hábil para desenvolvimento de material ou ensaios. Mesmo assim, há um clipe de “Tempo Ruim”, gravado no Dharma Studios e no ar no canal de Jimmy no YouTube desde 17/04. Quando ele foi gravado? Antes do surto do vírus?

 

AA: O Matanza Ritual foi um convite que recebi, com muita alegria, do amigo Jimmy London e que extrapolou o lance de tocar as músicas do Matanza, pois estamos realmente nos dedicando ao lado autoral. Legal demais e um time incrível. Um prazer tocar com esses caras. E, sim, esse material que tem no YouTube foi gravado antes da pandemia.

 

VM: O citado Fabiano crava que a sonoridade é mais voltada ao metal e não ao countrycore original do Matanza. O plano é seguir por aí mesmo?

 

AA: Na real, tem um pouco dos dois mundos. A ideia é ter relação com o som do Matanza, mas sem se tornar uma cópia daquilo. E com a personalidade dos músicos envolvidos, é inevitável que tenhamos uma característica própria.

 

VM: Ainda segundo o jornalista, chegou-se a anunciar uma turnê de dois meses, adiada por causa da pandemia. No geral, o que mais você pode nos contar sobre o projeto?

 

AA: Havia vários shows agendados, mas infelizmente a pandemia chegou. Agora estamos dividindo o nosso tempo aguardando pela possibilidade de continuar com a ideia da tour tocando os sons do Matanza e nos dedicando à finalização da composição do nosso primeiro disco autoral juntos.

 

 

 

 

VM: Como parte do “novo normal”, adaptando-se ao cenário atual, artistas estão gravando clipes remotamente. Vocês escolheram um petardo que merece ter muitos outros covers: “Born To Raise Hell”, do Motöhead, originalmente com participações especiais de Whitfield Crane (Ugly Kid Joe) e Ice-T (Body Count), e parte da trilha sonora de “Airheads” (1994), ou “Os Cabeças-De-Vento”, no Brasil. Como foi a experiência de gravar isoladamente a sua parte no clipe, disponível no canal do Jimmy no YouTube desde 14/07?

 

AA: Essa coisa de gravar à distância é algo a que já estou bem acostumado. Por morar em Recife, acabo tendo que fazer isso com frequência. Portanto, talvez seja mais natural para mim esse tipo de esquema “collab”.

 

VM: Quem propôs o registro dessa verdadeira pérola, até certo ponto escondida na carreira de Lemmy?

 

AA: Creio que foi uma ideia do nosso empresário e amigo, Paulo Baron. Todos nós curtimos na hora.

 

VM: Qual modelo de camiseta do Korzus você usa no clipe, aliás? Não reconheci nenhuma capa de álbum.

 

AA: Uso a camiseta “Support The Crew” do Korzus. Uma edição limitada muito foda que fizemos com arte do grande Alcides Burn [nota: conheça o trabalho do recifense responsável por capas de álbuns de bandas nacionais e internacionais em seu site: www.burnartworks.com]. Todo o lucro das vendas dessa camiseta será revertido para os nossos irmãos da equipe do Korzus.

 

VM: Quem juntou todo o material para editá-lo?

 

AA: O vídeo foi editado pelo Bruno Rocha e o cara mandou bem demais!

 

VM: E já que o nome do projeto é “Matanza Ritual”, você tem algum ritual antes de ir ao palco, seja lá um sinal da cruz, uma reza, um processo de concentração ou aquecimento?

 

AA: Baixar o capeta, tocar alguns riffs para aquecer os músculos, alongar o pescoço para doer menos no outro dia e subir no palco. Que saudade disso...

 

VM: Rumando à reta final e retomando o papo com o United By Metal, em resposta à penúltima pergunta lá (“Quais são as dificuldades de se viver de música no Brasil?”), você sabiamente aconselha quem aspira se tornar músico profissional a “abrir a cabeça e encarar como trabalho”, pois “não há vergonha alguma em você tocar algo que não gosta para pagar suas contas”, algo que os mais radicais e imaturos do meio (e, sim, eles ainda existem) talvez não compreendam. Fiquei me perguntando: já foi seu caso? Você já precisou tocar algum outro tipo de música?

 

AA: Nunca foi meu caso, pois sempre preferi investir em trabalhos paralelos (sou empresário) ao invés de tocar outros estilos. Mas como já falei antes: nunca tive nada contra quem faz isso. Esse tipo de pensamento radical é coisa para adolescentes de todas as idades [risos].

 

VM: Lá atrás, mais jovem, você já tinha essa percepção e tocava com a mesma garra de hoje? Ou é mesmo o tempo que traz essa sagacidade?

 

AA: Vontade e garra para tocar eu sempre tive. Amo esse negócio. Minha vida nunca fez sentido sem música.

 

VM: Finalizando, você está plenamente satisfeito quanto ao número de bandas e projetos que te ocupam? Ou vem mais coisa aí pela frente?

 

AA: Estou super feliz por poder fazer tanta coisa legal. Gosto de desafios e sou apaixonado por criar, compor, estar em atividade. Por enquanto é isso aí. Está bom assim.

 

 

 

 

Korzus é:

@pompeukorzus (vocal)

@antoniokzs (guitarra)

@herostrench (guitarra)

@dicksiebert (baixo)

@rodrigooliveira_official (bateria)

 

Siga o Korzus nas redes sociais e canais oficiais:

Instagram: @korzus_official

Facebook: @korzus_official

 

Assessoria Korzus: Isabele Miranda @isabelemirandatv

 


Vagner Mastropaulo

Bacharel em inglês/português formado pela USP em 2003; pós-graduado em Jornalismo pela Cásper Líbero em 2013; professor de inglês desde 1997; eventualmente atua como tradutor, embora não seja seu forte. Fã de música desde 1989 e contando... começou a colaborar com o site comoas melhores coisas que acontecem na vida: sem planejamento algum! :)




blog comments powered by Disqus