Entrevistas

Thyresis

Por Fabiano Cruz | Em 24/07/2011 - 20:00
Fonte: Alquimia Rock Club

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

O nordeste brasileiro nunca deu valor ao Rock/Heavy Metal nacional no geral, mesmo gerando bandas como Stress, Camisa de Vênus, Ave Sangria entre outras que talvez, pela falta de mídia e suporte, até hoje são consideradas “underground”. Mas de uns tempos pra cá, a abertura ao estilo está aos poucos crescendo, mostrando excelentes bandas que vem surgindo e “metendo as cara” em trabalhos de qualidade inquestionável. De João Pessoa, o Thyresis, com o lançamento de seu primeiro disco, é uma dessas bandas que vem tomando espaço na cena nordestina e mostrando com garra e luta a cena metálica em questão. O Alquimia Rock Club conversou com o baixista, vocalista e produtor Victor Hugo Targino sobre o primeiro trabalho, e Heavy Metal no nordeste e as dificuldades de uma banda da região, as produções de bandas novas no Heavy Metal atual, entre outras coisas. Após a entrevista, a resenha do fulminante disco de estréia dessa banda que ousa muito musicalmente com seu complexo e contagiante Death Metal


Alquimia Rock Club - Começamos com a história da banda até o lançamento de Thyresis. Vocês já tem cinco anos de estrada e uma demo lançada em 2008 (Jorney Beyond Infinity). Como foram esses anos pré primeiro disco oficial?


V.H. Targino - Inconstantes, eu diria. Durante esse tempo fomos uma banda de períodos; gravamos a demo, fizemos shows em nossa cidade e em algumas cidades vizinhas, mas as coisas andaram devagar, com datas muito espaçadas. Um ano após o lançamento da demo acabei mudando para Recife por 2 anos e as atividades diminuíram bastante. Foi nesse período, inclusive, que começamos a trabalhar na produção do disco, num ritmo bem vagaroso. Infelizmente não alcançamos todos nossos objetivos nesses primeiros anos, mas estamos voltando às atividades e temos muitos planos.


Alquimia Rock Club - Mesmo sendo uma banda em começo de carreira, o Thyresis já passou por algumas mudanças de formação. Como foi sua adaptação à voz, que você chamou a responsabilidade para si depois da saída de Josué de Queiroz – que inclusive gravou as vozes da demo?


V.H. Targino - Na realidade, assumir o posto de vocalista foi uma mudança bem natural para mim, uma vez que eu escrevi a maior parte de nossas letras e por conseqüência as linhas de voz. Na demo eu já havia feito vários backing vocals e no palco sempre acumulava essa função, então, no fim das contas, para todos nós da banda foi uma decisão que ninguém precisou ponderar muito antes de tomar.


Alquimia Rock Club - A banda faz um Death Metal perfeito, mas com muitas influências do Power/Heavy Metal, principalmente no trabalho de guitarras. Essa sonoridade foi conquistada com o tempo com o Danilo Rufino tocando com diferentes guitarristas ou somente com a entrada de Eduardo Borsero na banda se deu essa característica?


V.H. Targino
- Não, não, a sonoridade já estava definida desde nossa primeira música! Desde o início queríamos fazer Death Metal com influências diversas e Danilo foi uma peça chave nisso, pois é uma pessoa muito atenta ao Power/Heavy Metal. A entrada de Eduardo infelizmente só se deu após as gravações do álbum já estarem completas, então ele acabou não tendo muita participação no direcionamento musical. De qualquer maneira, apesar do disco não ter saído ainda, já estamos compondo com ele e creio que a partir dos próximos lançamentos as músicas terão um pouco mais de sua personalidade.


Alquimia Rock Club - Liricamente, o trabalho é dividido em cinco partes, abordando muito da psicologia e do lado mais obscuro e realista da humanidade, tornando um disco de certo modo conceitual. Como você escreveu a maioria das letras, poderia explicar um pouco mais do conceito delas?


V.H. Targino - O conceito do disco girou em torno de uma organização de idéias e visões sobre o mundo baseadas em experiências pessoais nossas (e principalmente minhas). Eu quis pegar parte do que senti e vivi, e expor de uma forma crítica, porém positiva, com objetivos de superação.
Não apenas isso, escolhemos fazer um disco conceitual para meio que explicar o significado de Thyresis, que acabou se tornando uma forma de encarar a vida baseada na eliminação de barreiras (internas ou externas) e não apenas um nome sem significados e profundidade.


Alquimia Rock Club - Outra coisa que chama muito a atenção são falas de Charles Milles Manson no disco. Como se enquadra o pensamento de um “serial killer” no contexto do Thyresis?


V.H. Targino - No caso, não utilizamos “o pensamento de um serial killer” na forma mais pura do termo. A idéia de adicionar as falas dele surgiu por acaso, quando eu estava assistindo uns vídeos no YouTube aleatoriamente e acabei esbarrando nesse; achei muito curioso o que ele falou, pois foram palavras extremamente lúcidas e coerentes, e achei a ironia do fato incrível, tanto que resolvi adicionar no disco para tornar um pouco mais ácida a crítica que faço a sociedade com as letras e textos.


Alquimia Rock Club - Musicalmente, o trabalho é soberbo, não ficando nada atrás de bandas “gringas”. Você, além da voz e do baixo, tomou conta também da produção e mixagem; como foi realizar todo esse trabalho em estúdios nacionais? Aproveitando a deixa, hoje em dia é mais fácil uma banda em seu primeiro disco realizar um trabalho perfeito como o de vocês devido à alta demanda e fácil acesso à tecnologia musical?


V.H. Targino - É sempre um trabalho difícil e cheio de rodeios. Gravamos tudo em estúdios de pequeno porte e em meu home studio, mas isso não tornou o processo tão mais acessível, pois certos cuidados que devem ser tomados dentro do estúdio muitas vezes acabaram sendo deixados de lado por causa de baixo orçamento.
Um exemplo: para gravar uma bateria bem, precisamos não apenas de uma boa bateria, mas de peles novas que custam caro afinadas apropriadamente, uma sala ampla, diversos microfones para captarmos as diferentes nuances de cada peça, além de tempo para conseguir uma performance perfeita. Uma banda iniciante com pouco dinheiro e nenhum tipo de apoio ou patrocínio dificilmente consegue arcar com todos esses gastos para gravar apenas uma bateria, pois isso tudo ficaria por muito mais que mil reais mesmo num estúdio pequeno. Então o trabalho se torna difícil porque temos pouco tempo para tirar o melhor do mínimo, e temos que recorrer a técnicas de edição e mixagem que consigam cobrir as falhas que sempre encaramos durante a gravação.
No caso do Thyresis, tivemos uma certa vantagem pois eu já tinha experiência em estúdio também como engenheiro de áudio, além de que os 2 anos que morei em Recife foram exatamente para me formar em produção musical, o que fiz com êxito e foi de grande valia para nosso álbum.


Alquimia Rock Club - Você também já trabalhou com outras bandas, inclusive de fora. Como ta sendo esse trabalho de produtor com bandas de outros países dentro do Heavy Metal? O Thyresis teve, de certa forma, alguma influência musical de “escolas” de outros países com esse seu trabalho?


V.H. Targino - Está sendo incrível! Quando comecei a fazer minhas produções caseiras há uns anos, não esperava que os resultados que alcancei repercutissem a ponto de eu conseguir trabalhos fora do país! E isso de certa forma tem influenciado meu modo de encarar música, pois trabalhando como produtor eu encaro o produto em construção antes do produto como um todo, e acabo vendo novas perspectivas musicais singulares, novos pontos de vista em termos de composição. Um dos trabalhos mais legais que fiz foi a mixagem e masterização do primeiro disco da banda sueca Akribi, de Prog Metal; músicos muito criativos e uma vocalista excelente, eles, por exemplo, me mostraram com sua música muitas coisas que eu não havia pensado antes e espero explorar um dia.


Alquimia Rock Club - A masterização ficou a cargo do experiente Jens Bogren (Opeth, Amon Amarth, Paradise Lost, entre outros). Como foi o contato com ele? O Bogren teve total liberdade no trabalho ou vocês acompanharam passo a passo a masterização?


V.H. Targino - Foi tudo muito simples: enviei um e-mail perguntando seus preços, ele respondeu, e daí fomos nos organizando para a troca de arquivos online até o fim do trabalho. Infelizmente não pudemos acompanhar o processo junto com ele, pois viajar para Suécia não é exatamente barato, principalmente para uma banda ainda formada por estudantes. De qualquer maneira, eu o contatei em primeiro lugar porque já conhecia seu trabalho e sabia que ele iria fazer o melhor para o álbum, então não tivemos nenhum problema; quando ele terminou, a primeira versão que ele mandou imediatamente se tornou a final e não tivemos reclamações.


Alquimia Rock Club
- A banda nasceu em João Pessoa, lugar onde o Rock’ n’ Roll/Heavy Metal nunca foi forte, mas de uns tempos pra cá, com festivais como Abril Pro-Rock e bandas participando ativamente de eventos, como as seletivas Battle Wacken, do Wacken Open Air, o espaço no nordeste – no geral – para esse estilo musical foi abrindo um pouco mais. Como vocês, situados bem ai, vêem a cena nordestina?


V.H. Targino - Ainda muito desunida e pouco explorada. Temos ótimas bandas aqui, como por exemplo o Soturnus, o Metacrose ou o Dissidium, mas não são muitas as pessoas interessadas em organizar eventos de metal, pois o público, apesar de sempre ser grande, não tem o costume de realmente entrar nas casas de shows e os produtores comumente terminam em prejuízo. Para você ter uma idéia melhor, o Wacken Metal Battle de João Pessoa foi organizado por um produtor de Recife, que viu uma boa chance de inovar em termos de shows e correu para cá. O pessoal de João Pessoa, infelizmente, está acordando agora para as possibilidades de carreira no mundo do Heavy Metal, então tudo caminha muito devagar.


Alquimia Rock Club - Uma última pergunta: Qual o significado de Thyresis e como se deu a escolha desse exótico nome?


V.H. Targino - O nome, a princípio, não possuía significado nenhum: apenas uma palavra que soava forte e marcante para uma banda. Mas depois que decidimos utilizá-lo para valer, resolvemos escrever um primeiro disco conceitual que explorasse esse nome e atribuísse sentido a ele. No final das contas, ele representa tudo que já falei sobre o conceito do disco.


Alquimia Rock Club - O Alquimia Rock Club agradece a entrevista e deixa o espaço final aberto para o Thyresis!


V.H. Targino - Muito obrigado pela oportunidade e pela excelente entrevista! Esperamos lançar mais e mais coisas e dar as caras mais vezes por aqui com boas novidades, sem dúvidas. Nos vemos nos palcos!


Thyresis - 2011 - Thyresis


Se pegar referências do Heavy Metal mundial, é fácil definir o som do disco de estréia do Thyresis: é a junção do mais puro Death Metal feito pelo Death com as belas, épicas e intrigadas melodias em “twin guitars” do Blind Guardian. O som criado pela banda é de uma personalidade única e forte e vai pelo disco todo passeando com a maior naturalidade por essas duas características; e o mais impressionante que não soa cansativo como em muitas bandas de Death Metal melódicas, tornando o primeiro trabalho muito dinâmico. O disco conceitual que fala muito dos problemas internos da humanidade e do homem (como vocês leram mais detalhado na entrevista acima) são muito bem amparadas pelas complexas passagens que a banda faz. Algumas canções são bem contagiantes, como Journey, Dispersed, Beyond Infinity e Risen; composições que soam como um “tapa no meio do ouvido”, cheias de melodias que grudam na cabeça e uma cozinha poderosa que soa como um tanque de guerra passando por cima de todo mundo. Alguns sons beiram a (hoje) tênue linha que o Metal extremo tem com os sons mais progressivos; isso acontece nas pequenas composições que dão uma certa introdução à outras, como a abertura do trabalho com Silent Monologue e Broken Home. O melhor momento talvez fique com a instrumental que leva o nome da banda: com um ritmo mais cadenciado e com um clima soturno, a música fica ainda mais forte e sombria nos momentos em que aparece Charles Manson falando algumas de suas idéias sobre o mundo; uma composição que realmente prende a atenção.


Os músicos são instrumentistas de mão cheia. A técnica do baterista Demetrius Pedrosa chega a impressionar; o cara toca um absurdo em complexas partes que são bem quebradas e o bumbo duplo come solto pelo trabalho. Victor Hugo Targino é o cara que comanda o volante dessa máquina: além de ter o baixo muito bem timbrado e uma voz gutural que entendemos palavra por palavra cantada (algo um pouco difícil de ter em bandas de Death Metal que estão em começo de carreira), ainda é o responsável pela maioria das composições e da belíssima produção – que impressiona pela qualidade por ser o primeiro trabalho da banda, pois o som é muito bem equalizado e cristalino, ouvindo instrumento por instrumento, não soando nada embolado. Mas o “surreal” fica por conta da dupla Danilo Rufino e Eduardo Borsero... quem escuta pela primeira vez o disco é capaz de achar que estão juntos a pelo menos uns 15 anos! Riffs e mais riffs complexos tanto ritmicamente como harmonicamente – muitos deles feitos em camadas de acordes -, melodias em “twin guitars” muito bem boladas e construídas e solos e tirar o fôlego de qualquer um são as armas dos dois; não me lembro de quando em seu primeiro disco uma dupla de guitarristas de uma banda nacional soassem tão perfeitamente assim!


Junte tudo e temos em mãos uma das mais belas estréias de uma banda de Heavy Metal em solos nacionais, sem nenhum exagero. So resta agora o Thyresis ter a sempre requerida paciência e a mídia especializada ver e conhecer o trabalho dos caras, pois qualidade para estourar no Brasil – e fora! – e ter o primeiro disco reconhecido o quarteto já mostrou que tem.
 


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Fabiano Cruz

Músico formado em composição e arranjo, atualmente expande seus estudos musicais na UNIS em licenciatura. Possui DRT em Jornalismo e Produtor Cultural e trabalha na área de criação musical, com já fez trabalhos em produções artísticas, rádio e TV.




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