Além dos Cogumelos

Khan

Por Ronaldo Rodrigues | Em 02/09/2009 - 17:00
Fonte: Alquimia Rock Club

A Banda

 


A história começa com o jovem Steve Hillage, que tinha abandonado a banda Arzachel em 1969 para continuar seus estudos (ao contrário da imensa maioria dos jovens músicos da época) na Universidade de Kent. Durante o período em que esteve estudando, Hillage continuou compondo e escrevendo, dentro de um período muito profícuo e inspirado, que refletiu no trabalho da banda Khan. No final de 1970, ele chegou em Londres disposto a iniciar um novo projeto, recrutando para tal, seu amigo baixista e vocalista Nick Greenwood, que tinha estrada com o maluquete Arthur Brown em seu "Crazy World´s of Arthur Brown". Outros dois amigos de Nick se ajuntaram nessa primeira formação - Eric Peachey (baterista) que era da Dr. K's Blues Band e o tecladista Dick Henningham. A idéia original era chamar Pip Pyle para a bateria, mas ele estava envolvido com o Gong naquela época.

 


Hillage aproveitou a amizade que cultivou com o pessoal do Caravan, na época da faculdade, para descolar um espaço no selo Deram e o empresariado de Terry King. Quando a banda estava para gravar seu primeiro registro, em novembro de 71, Dick Henningham pula fora. Segundo depoimento de Dave Stewart, esse cara tinha problemas pessoais e não conseguia conciliar os compromissos de banda com seu namoro (parece que a garota vetava as atividades do cara na banda aos domingos porque gostava de cozinhar um rango especial para ele). A saída encontrada por Hillage para seguir em frente foi chamar o velho parceiro de Arzachel, Dave Stewart, que pilotava os teclados na banda Egg (formada dos remanescentes do Arzachel). Stewart aceitou, visto a amizade com Hillage e o fato de ter gostado muito do material composto pelo amigo. A química entre a banda e o novo membro foi fantástica. A contribuição dos teclados de Stewart foi acachapante no disco e colaborou para elevar a música do Khan ao patamar de sofisticação e refinamento que hoje milhares de fãs de rock progressivo admiram. As gravações de "Space Shanty" seguiram rapidamente e foram concluídas ainda em 71.

 


Antes de gravar o disco, a banda já estava com a cara na rua, tocando no circuito londrino e abrindo shows para grupos como Caravan, Steamhammer, Gnidrolog, Gary Wright e Audience, entre outros. Apenas em maio de 72 a Deram lança o disco "Space Shanty". Em junho, a banda segue para uma tour promocional do disco, contando com o tecladista Val Stevens, que tinha entrado na banda em fevereiro. Em agosto de 72, após a derrocada do Egg, Dave Stewart volta a trabalhar com o Khan. Nessa altura, a formação já era outra - Steve Hillage, Eric Peachey, Nigel Griggs no baixo (que depois integraria o Split Enz) e Dave Stewart.

 


Esse vai-e-vem de músicos dificultou as coisas para a banda, que não conseguia dar continuidade aos seus trabalhos de divulgação do álbum. Mas mesmo assim, essa última formação começou a trabalhar em um novo material, que viria a ser aproveitado dentro do primeiro disco solo de Hillage, o clássico Fish Rising, 3 anos depois. O empresário Terry King era um cara bem esperto e acabava pressionando a banda a dar duro. Quem sentiu mais a pressão foi Hillage, ainda mais com o fato de não conseguir manter membros fixos na banda para executar o complexo material do disco. Em outubro, é a vez do próprio Steve Hillage desistir do lance e seguir para a Kevin Ayers' Band, integrando também depois o Gong. Daí a banda quebra de vez.

 


Nicholas Greenwood, o baixista e vocalista original da banda, já tinha algum material composto antes do início do Khan e depois que debandou foi para os EUA, onde registrou seu primeiro disco solo, "Cold Cuts", que se transformou num item muito procurado por colecionadores de todo o mundo.

 


O Disco

 


Space Shanty é marcado por um talento promíscuo, disposto a traçar riffs poderosos e padronizados do hard-rock, levadas “jazzy”, erudição clássica, senso improvisador com maestria instrumental e dote composicionista de melodias. Não há como escrever isoladamente de nenhuma música, trecho, solo instrumental ou acompanhamento porque aqui tudo é um monumental encontro de perfeições sonoras, seja nas entrelinhas ou naquilo que salta de imediato aos ouvidos. Um disco histórico, devocional, com o melhor do auge do rock progressivo dos anos 70.

 


A banda consegue impressionar tanto pelas mágicas e cerebrais harmonias por sobre inconvencionais distribuições matemáticas de ritmo quanto pela beleza descompromissada de simples acordes palpitados nas cordas de um violão. Há um espectro tão rico e belo de sonoridades de teclado (órgão e piano, sem sintetizadores) e guitarra (distorcida e acústica), tão intensamente explorado, que alcança o nível do cultuável. Nem virtuosismo, nem dramaticidade; nem inovação, nem mediocridade; nem improvisação, nem arranjismo. Nenhum elemento sequer beira o exagero, mas atua numa precisa (e muito rara) sinergia.

 


De cósmicas passagens vocalizadas aos riffs incisivos da guitarra sobre maciças pratadas e aos momentos de intervenção musical declaradamente livre, tudo acontece neste disco com perfeição. Os temas jazzistas são manejados com refinamento e há uma possante pegada rock ora ou outra interludiando uma cândida linha musical de guitarras ou teclados. As partes vocais, apoiadas em grande parte nos trechos suaves, são fantásticas em sua construção e, em boa parte do tempo, harmonizadas em duo.

 


Há tanta variação e tanta fartura de boas idéias que não raro obriga o ouvinte a uma nova audição para uma melhor apreciação. O disco foi relançado em CD apenas em 2004 e hoje também está disponível numa bela edição japonesa no formato “digipack”. Em vinil, apesar de não ser rara, uma cópia em bom estado abocanha uma quantia considerável de dinheiro.

 


1.  Space Shanty
2.  Stranded
3.  Mixed Up Man of the Mountains
4.  Driving to Amsterdam
5.  Stargazers
6.  Hollow Stone



Ronaldo Rodrigues

 Ronaldo Rodrigues é Colaborador Esporádico




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